O avanço da Covid-19 tem trazido consequências sociais e econômicas globais. Diversos governos ao redor do mundo, como forma de conter o avanço da pandemia, determinaram inúmeras medidas restritivas. Entre elas, o isolamento social, o fechamento das fronteiras e controles quanto à locomoção.
Isto, por sua vez, impactou de forma drástica o comportamento dos consumidores, resultando na diminuição das atividades econômicas a nível global e, consequentemente, na redução da demanda por produtos derivados de petróleo, utilizados, principalmente, no setor de transporte. Este segmento, hoje, representa mais de 50% do consumo mundial de petróleo, segundo dados do World Oil Outlook 2019.
Porém, além do colapso dos preços e da queda da demanda mundial de petróleo, em janeiro de 2020, os grandes produtores, Rússia e Arábia Saudita, iniciaram uma guerra comercial violando o acordo que os países da Opep+ – grupo no qual a Arábia faz parte – e a Rússia possuíam para o controle da produção mundial de petróleo e, consequentemente, do seu preço.
Ambos os países decidiram aumentar substancialmente a produção do seu petróleo e esse aumento gerou um choque no mercado. Essas mudanças fizeram a produção global alcançar, no mês de março de 2020, cerca de 99 milhões de barris por dia, num momento em que a demanda estava reduzida.
Impactos das crises de demanda e oferta
Diante desse choque duplo de demanda e oferta, estima-se que a capacidade disponível possa ficar saturada no meio do ano, segundo o relatório Oil Market Report – April 2020 da IEA (Energy Information Administration).
Segundo os dados do relatório, existem gargalos em outras partes da cadeia logística, como a concorrência para comprar espaço nos sistemas de oleodutos, os quais alguns estão sendo utilizados para armazenar petróleo. A indústria jamais chegou tão perto de testar sua capacidade logística até o limite.
Além disso, nesse cenário de baixa demanda e oferta elevada, ocorreu um fato inusitado nos contratos futuros do petróleo WTI (West Texas Intermediate) com vencimento em maio de 2020, em razão desse tipo de contrato exigir a entrega dos volumes físicos de petróleo bruto por meio de tubulação ou instalação de armazenamento em Cushing, Oklahoma.
Segundo o EIA, embora as instalações de armazenamento de petróleo bruto em Cushing tenham 76 milhões de barris de capacidade de armazenamento operacional – dos quais 60 milhões estavam preenchidos e boa parte da capacidade restante estava comprometida através de contratos de aluguel para futuras cargas -, o que sobrou da capacidade de armazenamento ficou tão cara que o negócio perdeu sua viabilidade, resultando em um crash do preço do petróleo WTI.
Seguindo o mesmo caminho, o petróleo tipo brent, referência internacional para preço no mercado brasileiro, também passa por dificuldades apresentando queda no ano de 2020 superior a 60%.
Situação do Brasil na crise
No Brasil, o país estava saindo de um padrão de baixo crescimento no segundo semestre de 2019 através das reformas econômicas, que deveriam elevar a economia em 2020. Contudo, com a crise de demanda gerada pela COVID-19, houve uma queda expressiva no consumo interno de derivados de petróleo. Segundo a ANP, no mês de março de 2020, houve uma queda no consumo de gasolina de 13,34% em relação ao mesmo período do ano passado.
Além da diminuição na demanda, o mercado de petróleo também sofre pela alta do dólar, que neste ano superou a casa dos 5 reais, alcançando seu pico no valor de R$ 5,7253. O problema com a cotação do dólar ocorre em razão de grande parte dos insumos se originarem de importações e do fato da Petrobras – principal empresa do mercado – possuir sua dívida constituída na moeda americana.
Possíveis cenários de retomada no pós Covid-19
Pensando em possíveis cenários para o pós-crise, o EIA prevê uma retomada gradual no consumo mundial de petróleo a partir do terceiro trimestre de 2020.
Na tentativa de conter a queda dos preços, os produtores de petróleo do grupo da OPEP concordaram em reduzir a produção em 9,7 milhões de barris por dia, a partir do dia 1º de maio. Além das medidas anunciadas pela OPEP, existem outras sendo realizadas pelos países do G20.
No caso do Brasil, destaca-se que, segundo projeção do relatório focus do Banco central, a previsão do dólar é se estabilizar na casa dos 5 reais, no valor de R$5,20, para o ano de 2021. Ademais, com a retoma da economia chinesa, o mercado de petróleo brasileiro se beneficia, em virtude do Brasil ser a 4ª nação em volume de petróleo importado pela China.
O “Novo Normal” no mercado de petróleo
Portanto, fica cada vez mais claro para o mercado que, apesar da recuperação dos preços, os patamares não serão retomados como antes das crises. Além disso, existe uma grande probabilidade da lógica de controle de produção chegar ao fim em razão da popular teoria “peak oil” – a qual previa um esgotamento rápido das reservas de petróleo – não estar se confirmando.
Atualmente, o que se percebe é que, com advento das novas tecnologias, ocorre o inverso. As reservas de petróleo estão crescendo e a demanda a longo prazo tende a diminuir. Isso acontece em virtude de legislações mais rigorosas sobre a queima de combustíveis fósseis e do barateamento das energias alternativas.
Neste cenário, onde as incertezas no mercado são maiores a cada dia, a necessidade de se ter uma capacidade de rápida adaptação à mudança se torna vital. Empresas que não estiverem preparadas, não sobreviverão ao “novo normal” do mercado. As companhias precisam criar resiliência e evoluir para que possam sobreviver neste novo contexto.
Autores: Murilo Maciel, Bernardo Caldeira e Rubem Gama – consultores da Bip Brasil
A Bip é uma consultoria internacional, presente no Brasil desde 2007. Fundada em 2003, na Itália, possui mais de 2700 profissionais, com projetos em mais de 40 países e 12 escritórios em países da Europa, América e Oriente Médio. Especializada no redesenho e transformação de grandes organizações para enfrentar desafios atuais e futuros.
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