Os dados do Censo 2013 do Setor de Tecnologia da Informação, desenvolvido no Brasil pela Assespro Nacional, em cooperação com a ALETI (Federação das Entidades de TI da América Latina, Caribe, Portugal e Espanha), trouxe alguns resultados inesperados.
Selecionamos aqui o comportamento das empresas do setor de TI em relação ao software de código aberto. Dado que o Governo Federal desenvolve ações específicas de fomento a este tipo de software desde 2003, esperávamos que o Brasil fosse destaque neste quesito.
A partir da pergunta sobre os sistemas operacionais usados como plataforma tecnológica para os produtos e serviços que comercializam, concluímos que, no Brasil, 41% das empresas fizeram opção por alguma distribuição do Linux. Apenas a família de sistemas operacionais da Microsoft, usada por 78% das empresas, possui participação maior. Os sistemas da Apple estão em 10% das empresas, enquanto os demais sistemas operacionais para dispositivos móveis alcançam 28% de participação.
Entretanto, quando comparamos o uso do Linux com os demais países estudados, chama a atenção que o Brasil apresenta índices inferiores aos de outras regiões. Por exemplo, nos países do Cone Sul (Argentina, Chile, Bolívia, Paraguai e Uruguai), o Linux é parte da plataforma tecnológica de 58% das empresas. Já no México e na América Central, esse índice é de 49%. Apenas na Península Ibérica (Portugal e Espanha) o índice de utilização do Linux é semelhante ao do Brasil.
Cabe, portanto, questionarmos por que as políticas públicas de fomento ao software livre, implementadas há mais de dez anos, não surtiram o efeito desejado. Se a utilização é maior em países que não investiram dinheiro público nessa direção, é imediato concluirmos que algo houve de errado com a realização dos investimentos gerados em função dessa política.
Uma análise dos projetos de fomento ao software livre revela que a maioria dos investimentos desse tipo foi direcionada ao uso de software livre dentro da própria máquina do Estado, no meio acadêmico e na comunidade de voluntários que coopera nesse tipo de projetos.
Ainda assim, o índice de utilização nas empresas privadas de TI deveria ser semelhante ao obtido em outros países..
O fato de ser inferior pode ser interpretado como um “tiro no pé” da implementação da política: a forma como ela foi conduzida acabou levando empresas privadas no Brasil a usar menos o software livre do que as empresas de outros países.
Este fenômeno não é limitado apenas ao Linux. Quando avaliamos o uso de tecnologia aberta em geral, verificamos que, no Brasil, 38% das empresas usam essa tecnologia em seus processos internos com frequência ou de forma contínua. Já nos países do Cone Sul e na Península Ibérica, esse índice é de 55%.
Finalmente, a diferença obtida na disponibilização da tecnologia desenvolvida pelas empresas seguindo o modelo de código aberto é ainda maior: enquanto essa prática é comum no Brasil em apenas 9% das empresas, no Cone Sul, este índice alcança a 22% e, na Península Ibérica, é prática de 28% delas.
Concluímos, portanto, que as políticas públicas brasileiras destinadas ao fomento desse tipo de modelo não apenas não foram bem sucedidas, mas terminaram por deixar o país atrasado.
Desde o lançamento do programa TI Maior, em agosto de 2012, o foco das políticas públicas de fomento à indústria de TI foi deslocado para o conceito de ‘produto nacional’, o que levou, por exemplo, à criação da CerTICs, no ano passado.
Esperamos que estas novas políticas nos permitam recuperar o ‘tempo perdido’, para que possamos desenvolver uma indústria local de TI que seja competitiva em nível global.
*Roberto Carlos Mayer é presidente da ALETI (Federação das Entidades de TI da América Latina, Caribe, Portugal e Espanha)
e vice-presidente de Relações Públicas da Federação das Associações de Empresas Brasileiras de Tecnologia da Informação (Assespro Nacional).