Os preços dos materiais utilizados na construção civil não param de subir. Com isso, orçamentos pactuados entre construtoras e donos de obras ficaram defasados e muito tem se falado sobre a necessidade de reequilíbrio dos contratos do setor.
Alguns dos insumos apresentam reajustes acima do INCC – Índice Nacional do Custo de Construção, o que prova que o indicador já não capta a totalidade do aumento dos custos. Porém, este é o índice utilizado para reajustes em praticamente todos os contratos da construção civil.
O aumento nos preços dos materiais utilizados no setor, como aço, cimento e bloco de concreto, vem acontecendo em decorrência da pandemia de Covid-19, da guerra entre Ucrânia e Rússia e do mais recente lockdown da China. Entre os muitos efeitos que esse conjunto de eventos imprevisíveis causou no mundo está a necessidade de reequilíbrio dos contratos na indústria da construção civil.
Os índices econômicos são formulados para refletir a variação de preços médios de uma determinada cesta. Para Eduardo Zaidan, vice-presidente de Economia do Sinduscon-SP, todos os indicadores devem ter suas cestas revisadas periodicamente. Durante webinar realizado no último dia 31 de maio, Zaidan explicou o porquê.
“Evolução tecnológica, hábitos de consumo, surgimento de novos materiais, mudanças no modo de contratar, alterações tributárias, tudo isso deveria ser levado em consideração para que o INCC continue refletindo a realidade do mercado”, pontua Zaidan.
O que vem acontecendo é que, no momento de contratar, estima-se uma variabilidade esperada do INCC, levando-se em conta características da obra, tempo de execução, insumos etc. Porém, alguns insumos vêm apresentando um aumento de preço 50% acima do indicado pelo índice nacional. Ou seja, com o passar dos meses, finalizar a obra torna-se mais caro do que o projetado.
Neste ponto, uma das partes da contratação pode passar a se sentir prejudicada. Por isso, tem se falado tanto em reequilíbrio dos contratos na indústria da construção civil.
Entendendo a inflação setorial
Para Eduardo Zaidan, vice-presidente de Economia do Sinduscon-SP, é importante entender quais são as origens da inflação setorial no Brasil. De acordo com Zaidan, existem origens conjunturais e estruturais a serem observadas.
Ele explica que as origens conjunturais estão nos jornais todos os dias. Trata-se da desorganização das cadeias produtivas, dos preços relativos, da desorganização da logística, da alta das commodities, do dólar e do petróleo etc.
“Já a inflação setorial é resultado das decisões econômicas tomadas desde a saída da crise de 2008”, pontua Zaidan. Nos últimos oito anos, o PIB brasileiro encolheu pouco mais de 1,5% e a renda média das famílias brasileiras caiu cerca de 10%. “Isso deixou cicatrizes muito profundas em toda a cadeia produtiva, o mercado ficou menor, a produção de insumos ficou muito mais concentrada, menos flexível e menos ágil. E nesse cenário, qualquer aumento de demanda resulta em inflação, pois a capacidade produtiva não consegue reagir”, lamenta Zaidan.
Diante disto, diversos atores da indústria da construção civil identificaram que é preciso pensar em uma nova maneira de contratar, mais adequada para os contratos de longo prazo. Uma forma que leve em consideração num cenário de volatilidade inerente a uma economia de dificuldade e, assim, reencontrar a rota do crescimento.
Reequilibrando os contratos da construção civil
De março de 2020 para o presente momento, o INCC não conseguiu acompanhar a variação do preço dos insumos do atacado no local de compra para o construtor. A variação do INCC no primeiro quadrimestre de 2022 esteve por volta de 3%, enquanto diversos itens da cesta da construção civil chegaram a 10% de aumento. Isso sem falar no aumento do custo da mão de obra.
Então, o que acontece na prática é que existe um orçamento pré-determinado, mas que é extrapolado. Não por erro da definição do orçamento, mas sim porque a variação efetiva de todos os custos envolvidos naquele empreendimento é maior do que o INCC consegue acompanhar. Ou seja, o dinheiro que a construtora recebe não é suficiente para concluir a obra.
A solução para esse desequilíbrio vem sendo discutida por diversas instituições. Para Olivar Vitale, advogado e membro do conselho jurídico do Sinduscon – SP, a primeira recomendação não é de rompimento de contato e comunicação entre as partes, mas sim de acordo.
“Entrar com medida judicial não é garantia nenhuma de sucesso. Nós temos que entender que por mais imprevisível que seja a Covid-19, o poder judiciário brasileiro não trata com facilidade qualquer quebra de contratos paritários, como é o caso que estamos analisando”, explica Vitale.
O advogado lembra, ainda, que a causa pode levar anos para ser julgada e a obra vai ter que continuar enquanto o processo acontece, pois o consumidor final precisa receber o bem.
Porém, sabe-se que nem sempre o consenso é atingido e, para estes casos, há subsídio legal para uma ação judicial.
De acordo com Vitale, é possível usar o artigo 317 do Código Civil que diz que “quando, por motivos imprevisíveis, sobrevier desproporção manifesta entre o valor da prestação devida e do momento de sua execução, poderá o juiz corrigi-lo, a pedido da parte, de modo que assegure, quanto possível, o valor real da prestação”.
O princípio da imprevisibilidade pode ser aplicado aos contratos que foram assinados antes de março de 2020, ou seja, antes da pandemia. Para os contratos que vieram depois disso, não há espaço para essa alegação, pois a Covid-19 já havia se espalhado.
Para Fábio Garcez, CEO da proptech CV CRM – Construtor de Vendas, o reequilíbrio econômico-financeiro nos contratos da indústria da construção civil faz-se necessário para o crescimento econômico do país. “É preciso entender que a infraestrutura é a base para o desenvolvimento da sociedade e que o desequilíbrio fruto das adversidades dos últimos anos pode frear a retomada econômica pela qual tanto lutamos”, declara Fábio.
Para auxiliar os diversos agentes do setor, a CBIC – Câmara Brasileira da Indústria da Construção – disponibiliza um hotsite com princípios básicos para reequilíbrio contratual. Para ter acesso às informações basta clicar aqui.
Website: http://www.cvcrm.com.br