Home Atualidades Pesquisadores brasileiros criam sensores de papel para detectar explosivos

Pesquisadores brasileiros criam sensores de papel para detectar explosivos

por Plantão da Redação

Investigadores de polícia e agentes de segurança de aeroportos poderão contar, em breve, com dispositivos mais baratos, portáteis e que fornecem resultados mais rapidamente do que os métodos utilizados atualmente para a detecção de explosivos em bagagens ou em locais considerados alvos potenciais de ataques terroristas.

Pesquisadores do Instituto de Química da Universidade de São Paulo (IQ/USP) desenvolveram um sensor eletroquímico (baseado em reações químicas que produzem energia) e outro colorimétrico (fundamentado na quantificação de uma substância pela percepção da cor) a partir de papel sulfite e filtro de papel (semelhante ao de café), capazes de detectar alguns dos explosivos mais utilizados atualmente em ações terroristas.

Os dispositivos foram desenvolvidos no âmbito do projeto “Utilização de medidas eletroquímicas, colorimétricas e de massa para discriminação de amostras de interesse forense e alimentício utilizando dispositivos inteligentes (línguas e narizes eletrônicos)”, realizado com apoio da FAPESP.

O sensor eletroquímico foi descrito em um artigo publicado no dia 6 de março na edição online da revista Analyst, da Royal Society of Chemistry (RSC). E o sensor colorimétrico foi descrito em novembro na edição online da revista Analytical Methods e será capa da edição de abril da versão impressa da publicação, também editada pela RSC.

“Tivemos a ideia de desenvolver dispositivos usando folha de sulfite ou outros tipos de papel utilizados em impressoras convencionais porque são materiais abundantes e fáceis de serem conseguidos em qualquer lugar do mundo”, disse Thiago Regis Longo Cesar da Paixão, professor do IQ/USP e coordenador do projeto, à Agência FAPESP.

“O objetivo é tornar os dispositivos para detecção de explosivos e outros compostos químicos mais baratos, acessíveis e com possibilidade de serem utilizados em locais remotos, sem a necessidade da infraestrutura de um laboratório de análise e pessoas treinadas para usá-los”, afirmou Paixão.

De acordo com o pesquisador, a utilização em larga escala de explosivos por grupos terroristas nos últimos anos levou ao desenvolvimento de novos dispositivos comerciais para a sua identificação e quantificação.

Os equipamentos disponíveis, no entanto, como detectores de captura de elétrons, espectrômetro de massas e leitor de raios X, são muito sofisticados e caros e exigem pessoas treinadas para realizar as análises.

Além disso, segundo Paixão, nem todas as técnicas são apropriadas para a detecção de peróxidos explosivos, tais como o triperóxido de triacetona (TATP) e o hexametileno triperóxido de diamina (HMTD), cujo uso por terroristas aumentou nos últimos anos em razão da facilidade de síntese e obtenção de materiais de partida para criá-los, como o peróxido de hidrogênio, ácidos e acetona.

Por isso, estão sendo desenvolvidos sensores eletroquímicos e cromatrográficos (baseados na separação de misturas e identificação de seus componentes) para a detecção desse tipo de explosivo que ganhou notoriedade depois dos ataques ao metrô de Londres, em 2005.

“O problema é que a maioria desses novos sensores utiliza papel cromatográfico e esse material é mais caro, em comparação com o papel sulfite”, afirmou Paixão.

A fim de encontrar uma opção mais barata, o pesquisador desenvolveu um sensor eletroquímico em um papel sulfite em parceria com o estudante William Reis de Araujo, que realiza doutorado sob sua orientação e com Bolsa da FAPESP.

A substituição do papel cromatográfico pelo sulfite reduziu em 97% o custo de fabricação do sensor por esse método, comparou Paixão. “Demonstramos que é possível desenvolver sensores eletroquímicos com papel sulfite e que a substituição do papel cromatográfico possibilita uma grande redução do custo desses dispositivos”, afirmou o pesquisador.

Combinação de materiais simples

Os pesquisadores utilizam uma impressora de cera para imprimir na superfície de uma folha de papel sulfite círculos brancos, com diâmetro de 1,6 centímetro e separados um do outro, onde são colocadas soluções ou amostras do material que se pretende analisar.

As folhas impressas são colocadas em uma estufa ou prensa térmica por três minutos e a 120 ºC. O processo de aquecimento faz com que a cera derreta e penetre todas as camadas do papel, formando uma barreira hidrofóbica (impermeável) que possibilita que a solução só penetre e fique confinada nos círculos brancos, que não receberam a impressão da cera.

Por meio de uma transparência com desenhos vazados, os pesquisadores pintam eletrodos na folha de sulfite impressa, utilizando uma tinta com condutividade elétrica (condutora) de prata.

Após a secagem da tinta, cada célula eletroquímica é recortada com uma tesoura, de modo a formar um dispositivo eletroquímico descartável com três eletrodos.

Ao ser conectado a um potenciostato (equipamento usado para aplicar um potencial e medir a corrente elétrica de uma solução condutora), o sensor eletroquímico à base de papel pode detectar ácido pícrico – um explosivo – e chumbo, que é um componente de resíduos de pólvora, afirmou Paixão.

“A ideia é que esses dispositivos tenham aplicações forenses e de segurança para a detecção de explosivos”, afirmou Paixão. “Mas eles também têm sensibilidade para íons cloreto e metais pesados, o que possibilita a sua utilização para monitoramento ambiental”, apontou.

Sensor colorimétrico

Com base no mesmo princípio do sensor eletroquímico, os pesquisadores desenvolveram durante o projeto de pós-doutorado da estudante Maiara Oliveira Salles, também realizado com Bolsa da FAPESP, um sensor colorimétrico que muda de cor ao ser exposto aos explosivos TATP, HMTD, 4-amino-2-nitrofenol (4A2P), nitrobenzeno e ácido pícrico.

Para produzi-lo, eles colocam nos círculos brancos – desta vez impressos em papel de filtro – pequenas quantidades de iodeto de potássio (KI), creatinina e anilina.

Em contato com cada um dos cinco tipos de explosivos, esses reagentes químicos produzem um padrão único de cores, que varia de acordo com a concentração do composto.

Cada variação de cor do sensor colorimétrico a diferentes concentrações dos cincos explosivos foi captada e armazenada em um aplicativo para smartphone, também desenvolvido pelos pesquisadores durante o projeto, em colaboração com Gabriel Negrão Meloni, aluno de doutorado do IQ.

O aplicativo é capaz de analisar, por tratamento matemático, a fotografia de um papel colorimétrico exposto a um dos cinco tipos de explosivos – tirada também por smartphone em um dispositivo batizado pelos pesquisadores de “dedo-duro” – e indicar qual o explosivo e em qual quantidade ele está presente na amostra com base em seu padrão de cor.

“O sensor colorimétrico permite que um agente de segurança de aeroporto, por exemplo, passe o papel sobre uma bagagem, depois tire uma foto pelo telefone celular e obtenha os resultados de análise do software, indicando a presença ou não de um explosivo”, explicou Paixão.

“Ele foi capaz de identificar quantidades muito baixas de explosivos, da ordem de 0,2 micrograma”, afirmou.

Segundo o pesquisador, os dois dispositivos ainda não foram utilizados em campo, em investigações criminais ou de detecção de riscos de segurança em aeroportos, por exemplo.

Outras aplicações

A ideia, no entanto, é viabilizar essas aplicações e possibilitar que os dispositivos também sejam utilizados para outras finalidades, como para detecção de drogas de abuso, como a cocaína.

“Temos estudado a aplicação do sensor colorimétrico para a detecção de substâncias químicas adicionadas à cocaína como adulterantes, tais como cafeína, paracetamol e fenatecina, para auxiliar a polícia a identificar a origem da droga”, contou Paixão.

Além de aplicações criminalísticas, o objetivo dos pesquisadores é que o princípio tecnológico dos sensores dê origem a uma alternativa mais barata para as tiras de teste glicosímetro, usadas para monitorar os níveis de glicose em pacientes com diabetes.

“A fita utilizada no teste do glicosímetro talvez seja substituída, no futuro, por uma folha de papel”, estimou Paixão.

O artigo “Fabrication of disposable electrochemical devices using silver ink and office paper”(doi: 10.1039/C4AN00097H), de Araujo e Paixão, pode ser lido na revista Analyst em pubs.rsc.org/en/content/articlelanding/2014/an/c4an00097h#!divAbstract .

E o artigo “Explosive colorimetric discrimination using a smartphone, paper device and chemometrical approach”(doi: 10.1039/c3ay41727a), de Paixão e outros, pode ser lido na revista Analytical Methods em pubs.rsc.org/EN/content/articlelanding/2013/ay/c3ay41727a#!divAbstract.

 

Agência Fapesp Brasil

Você também pode gostar

Deixe um Comentário

Ao navegar neste site, você aceita os cookies que usamos para melhorar sua experiência. Aceito Mais informações