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O que o mundo vê: A piscina olímpica, das seis medalhas de Phelps a criadouro de mosquitos

por Paulo Fernandes Maciel

Depois de cinco meses, o Parque Olímpico, com sinais de abandono, tem poucos visitantes e continua sem calendário de atividades.

 

Fotomontagem – Phelps nos jogos olímpicos e parque aquático em fevereiro/ AgênciaReuters

Rio de Janeiro, a cidade que em agosto de 2016 atraiu a atenção de todo o planeta, sofre uma forte ressaca pós-olímpica. Cinco meses após a imprensa mundial deixar o Rio, o estádio do Maracanã deixou de ser o palco de espetáculos de fogos de artifício, se apagaram as últimas luzes das arenas, e nada resta do brilho olímpico de uma cidade hoje em decadência e maltratada pela crise. O legado esportivo, o principal argumento para justificar os enormes investimentos que exigiram os Jogos, está questionado.

No Parque Olímpico, o palco principal da competição, só foi realizado um campeonato de vôlei de praia desde os Jogos, para o qual foi colocada areia no Centro de Tênis. Não existe um calendário de eventos esportivos e, por enquanto, a maior festa a ser realizada em seus bulevares será o festival de música Rock in Rio, em setembro. Fotos das piscinas onde Michael Phelps aumentou sua lenda deram a volta ao mundo há alguns dias: estavam com a água cor ocre, uma festa para os mosquitos.

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“Passei por lá outro dia e deu vontade de chorar. A Arena Olímpica está cercada por escombros”, diz Renata Fernandes, que há seis meses era uma fã eufórica com um totem de papelão da ginasta norte-americana Simone Biles debaixo do braço. Fernandes, que chegou a pedir férias para aproveitar ao máximo os Jogos, não entende por que o parque está sendo “desaproveitado”: “Poderiam usá-lo pelo menos para os blocos de carnaval. É um lugar enorme, todos poderíamos ir lá e aliviaria o trânsito da cidade.” Os bulevares do parque, na verdade, estão abertos ao público há três semanas, mas poucos se animaram. A Prefeitura não dispõe de dados sobre quantas pessoas visitaram e não há nenhum banheiro, nem fonte ou quiosque que convide a passar muito tempo sob um sol de 40 graus que aumenta o cheiro do esgoto lançado na lagoa do entorno do recinto.

Nos mais de um milhão de metros quadrados de superfície, vários órgãos dividem responsabilidades, do Governo Federal às construtoras. O prefeito que trouxe os Jogos para o Rio e que acaba de deixar o cargo, Eduardo Paes, tentou várias vezes ceder sua gestão para a iniciativa privada, mas ninguém ficou interessado em pagar por um gigante que consome cerca de 30 bilhões de reais por ano. O Ministério dos Esportes teve que assumir em dezembro e ainda não deu muitos detalhes de como vai transformar o Rio em um destino de competições internacionais.

A Prefeitura ainda é responsável por desmontar o Parque Aquático, que inicialmente levaria duas piscinas olímpicas para diferentes partes da cidade, mas que no final de contas vão ficar para treinos de alta competição do Exército. Também caberia ao município a transformação da Arena 3, que vai passar de palco de torneios de judô e taekwondo a um ginásio olímpico para cerca de mil alunos sem data para ser inaugurado. A Arena do Futuro, que sediou o handebol, ainda espera a licitação para ser desmontada e transformada em quatro escolas municipais. “Não há nenhum abandono”, defendem na Secretaria municipal de Esportes.

A iniciativa privada, asfixiada pela recessão, é dona de uma boa parte do terreno, mas não há nenhum sinal da projetada transformação do centro de imprensa em hotel e escritórios, bem como dos espaços vagos em empreendimentos de luxo. Perto dali, os 3.600 apartamentos da vila olímpica, onde os atletas se alojaram, esperam comprador: foram vendidos apenas 260. A construtora responsável, com pressa para recuperar seu dinheiro, estuda agora, junto à Prefeitura e a Caixa Econômica Federal, um acordo para vender os apartamentos o mais rápido possível e com juros baixos, a instituições públicas, como a Marinha.

A imprensa local e internacional critica o abandono enquanto o ex-prefeito, que prometeu várias vezes que o Rio não teria elefantes brancos, pede calma: “Contratos e acordos estão fechados, mas não dá para desmontar estruturas que levaram anos para serem montadas em poucos meses”. Londres, sede dos Jogos em 2012, também levou um tempo para reativar o Parque Olímpico, exatamente 19 meses, um paralelo que não conforta os críticos. “Londres tinha um plano, o Brasil não tem. O principal legado para Londres foi a revitalização de áreas degradadas. Muito diferente do que aconteceu no Rio, que investiu principalmente na Barra de Tijuca [bairro do Parque Olímpico], uma das áreas mais valorizadas da cidade”, lamenta Pedro Trengrouse, professor de gestão esportiva da Fundação Getúlio Vargas.

A menos de 20 km do Parque Olímpico permanece fechado o Parque Radical Deodoro, a segunda maior instalação dos Jogos e um oásis verde com água para um bairro pobre do subúrbio, a quase uma hora de carro da praia de Ipanema. O local, que sediou as provas de canoagem e BMX, chegou a abrir suas portas para os cariocas antes dos Jogos, quando o ex-prefeito percebeu que os vizinhos estavam pulando a cerca para desfrutar de uma piscina que não fosse inflável, mas está fechado desde dezembro. O contrato de gestão expirou e o novo prefeito, Marcelo Crivella, que adotou o slogan “é proibido gastar”, ainda está “estudando a maneira” – a assesoria da secretaria de Esportes não deu mais detalhes – de abrir as portas este mês. O guarda responsável pela custódia do parque adverte: “Nesta cidade não acontece nada antes do Carnaval”.

“Depois dos Jogos, uma análise inicial mostra que não houve uma preparação para o uso das estruturas”, denuncia o procurador do Ministério Público, Leandro Mitidieri. O procurador passou os meses prévios ao evento exigindo que as autoridades apresentassem o plano oficial de legado para a cidade e só conseguiu no dia que os Jogos começaram, em 5 de agosto, e graças a uma ordem judicial. O legado, não apenas esportivo, é questionável para Mitidieri. “Uma questão emblemática foi que descumpriram a promessa de descontaminar 80% da Baía da Guanabara [onde foram realizadas as competições de vela]. Ou seja, mesmo esse legado parcial [o das instalações] exigirá uma forte ação dos órgãos de fiscalização e da sociedade”, avisa.

O principal templo do futebol brasileiro, o Maracanã, onde a seleção ganhou um ouro e foi investido mais de um bilhão de reais para sua reforma, representa, com sua grama seca e assentos arrancados, a pior cara da ressaca olímpica. Um conflito entre a gestora do estádio, a Odebrecht, e o Comitê Rio 2016 deixou no ar sua gestão desde o final do evento. A primeira, que há muito tempo quer se livrar do Maracanã, se recusa a assumi-lo até que o Comitê assuma todos os reparos. E o Comitê, que ainda deve milhões aos seus fornecedores, defende que devolveu o estádio melhor do que estava antes. Enquanto isso, o governo do Rio, que não tem fundos nem para pagar os funcionários públicos, espera que o problema seja resolvido por si só com uma nova licitação.

“O Governo e o Comitê Olímpico Internacional prometeram muito e entregaram pouco. O Brasil deveria ter uma agenda própria nos Jogos e não se limitado a cumprir as exigências do Comitê. Por exemplo, os clubes Fluminense e Flamengo, que formaram o maior número de atletas olímpicos da história, deveriam ter recebido investimentos para melhorar algumas das suas instalações e até mesmo sediar algumas competições, uma garantia de que os equipamentos poderiam ser aproveitados depois”, afirma o professor Trengrouse. “Como agora se explica que depois de receber os Jogos Pan-Americanos, a Copa das Confederações, a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos e Paraolímpicos, o Rio de Janeiro nem mesmo tem um estádio de futebol para o Campeonato Carioca?”.

Fonte: http://brasil.elpais.com

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