Dar visibilidade às águas subterrâneas é tornar visível o que está totalmente invisível aos olhos da sociedade. Essa foi a tônica da palestra de abertura do Congresso Mundial de Águas Subterrâneas, realizada por John Cherry, considerado uma das maiores autoridades internacional em contaminação de águas subterrâneas e vencedor do Águas de Estocolmo 2020, o Prêmio Nobel do setor da água.
O evento, que aconteceu no final de agosto (22 a 26) continua a mobilizar uma imensa comunidade de geólogos, pesquisadores, técnicos, perfuradores e profissionais que compõem o segmento das águas subterrâneas no mundo.
Foram mais de 50 palestrantes de diversos países que discutiram a sobrevivência do planeta a partir do impacto das águas subterrâneas na pobreza, segurança alimentar e na crise global da água. Também não faltaram temas técnicos e científicos nos mais de 500 trabalhos inscritos.
Organizado pela ABAS – Associação Brasileira de Águas Subterrâneas, IAH – Associação Internacional de Hidrogeólogos e ALHSUD – Associação Latino Americana de Hidrologia Subterrânea para o Desenvolvimento, a realização de um evento virtual dessa magnitude foi um grande desafio para os organizadores.
“Foi preciso quebrar muitos paradigmas”, ressalta José Paulo Netto, presidente das ABAS. “Os esforços, no entanto, valeram à pena. Hoje podemos dizer com tranquilidade que conseguimos criar e consolidar a maior comunidade de profissionais águas subterrâneas do planeta.”
Carta Brasil-Bélgica
Neste mês de setembro foi a vez da IAH realizar em Bruxelas, na Bélgica, mais um evento para promover o uso sustentável das águas subterrâneas: 48º IAH Congress, que em função da pandemia, que acabou por acontecer em data próxima ao Congresso Mundial realizado no Brasil.
As entidades envolvidas, no entanto, souberam aproveitar a proximidade das datas alinhando conteúdos e propondo ações conjuntas para disseminação das informações sobre o tema, entre elas, a Declaração das Águas Subterrâneas de São Paulo-Bruxelas.
“A declaração é fruto de uma pesquisa realizada pelo Comitê Executivo da IAH, da ABAS e da ALHSUD na qual participaram centenas de hidrogeólogos de todo o mundo”, esclarece o presidente do comitê científico do congresso Ricardo Hirata. “Esse trabalho alerta, informa e orienta sobre a importância desse recurso para a sobrevivência do planeta e será amplamente divulgado junto aos governos, entidades internacionais e em diversas campanhas nas quais receberá adesões e assinaturas.
“Queremos alertar não só os tomadores de decisão, mas também a população mundial, já que somente uma sociedade consciente é capaz de exigir dos seus governos uma vida melhor e um ambiente mais saudável” ,completa Ricardo Hirata.
Garrafa-tocha
Outra atividade iniciada no Congresso Mundial recebeu o nome curioso de “Garrafa-tocha” e segue o mesmo conceito da Tocha Olímpica.
Uma garrafa azul contendo água subterrânea brasileira foi entregue ao comitê organizador do evento da Bélgica. Lá a garrafa contendo água brasileira foi analisada e recebeu água de um aquífero daquele país.
Ao final do congresso belga, a garrafa-tocha seguiu para a China, local do próximo evento em 2023, onde vai receber água subterrânea chinesa e assim por diante.
“Criamos uma tradição nos eventos realizados pelo Comitê Internacional. É uma ação simbólica que não só remete ao espírito olímpico da cooperação internacional como a urgência da união de esforços pelo uso sustentável das águas subterrâneas em todo o planeta”, esclarece Everton de Oliveira presidente do congresso e um dos idealizadores da ação.
“Precisamos ter a consciência de que esse é um recurso natural que abastece mais de 50% da população mundial e, em muitos casos, a única fonte de água, como nas regiões áridas e “semiáridas”, completa o presidente do Congresso.
Ética e gestão
As questões envolvendo ética, governança e uso sustentável das águas subterrâneas também foram tema da palestra de encerramento do evento, proferida por mais uma grande personalidade do setor: Emílio Custódio, professor emérito da Universidade da Catalunha, na Espanha.
Para o professor a captação de água subterrânea precisa ser suportável a curto e longo prazo e deve invariavelmente resultar em benefícios sociais.
“Todas as condições locais precisam ser consideradas, reforça Custódio. Nesse sentido, faz parte do comportamento ético dos gestores de águas subterrâneas investir no monitoramento sistemático das áreas, levando em conta as ameaças ao recurso hídrico e aquilo que realmente poderá beneficiar – ou não – a vida das pessoas”.
O professor da Universidade da Catalunha fez questão de lembrar que os recursos hídricos subterrâneos estão ameaçados pela superexploração e contaminação, fruto das atividades urbanas e agrícolas sem controle ou planejamento.
“A quantidade e a qualidade das águas subterrâneas estão interligadas: uma é de pouca utilidade sem a outra. A gestão sustentável passa invariavelmente por monitoramento, regulamentação e comunicação,” finalizou.
Sobre Águas Subterrâneas
• As águas subterrâneas são o recurso natural mais extraído do subsolo do planeta
• Responsável por 50% do abastecimento da população mundial
• Os aquíferos, reservatórios naturais de água, retêm 97% da água doce e líquida do planeta. São os principais aliados no enfrentamento das mudanças climáticas, já que longos períodos de seca têm pouco efeito sobre a disponibilidade de águas subterrâneas.
• As águas subterrâneas apoiam as atividades econômicas em todo o mundo, abastecendo 40% da agricultura irrigada e 30% das indústrias.
Website: http://www.abas.org