O Fotógrafo Luiz Moreira faz a sua primeira individual na Gabriel Wickbold Studio & Galery em São Paulo
Com vernissage em 19 de julho, a mostra “Porta do Mar” reúne 19 imagens em preto e branco captadas em Portugal que retratam o cotidiano de pescadores e moradores de aldeia paraexpor a fragilidade e as inquietações das relações humanas
Não se trata de fotojornalismo documental.
Mas, para quem dirige o olhar para as 19 obras que compõem a mostra “Porta do Mar”, a poética do cotidiano retratado por Luiz Moreira salta aos olhos.
Primeira individual do artista com vernissage em 19 de julho na Gabriel Wickbold Studio &Gallery, em São Paulo, a exposição é composta por imagens superdimensionadas em papel algodão e ficará aberta ao público entre 20 de julho e 20 de agosto.
Fotógrafo nascido no Jardim Ângela
Paulistano do Jardim Ângela, ex-modelo na juventude que passou de retratado a fotógrafo de editoriais de moda e formado em Comunicação Social, Moreira decidiu trilhar a descoberta da linguagem fotográfica há três anos. Hoje com 28 anos de idade.
Após participar de um coletivo de artistas na Gabriel Wickbold Studio &Gallery e ter um trabalho exposto na SP Arte 2018 (pela mesma galeria), o fotógrafo diz que suas imagens são fruto de sua inquietação quanto às relações humanas, como a do homem com a natureza e com seu próprio espaço e o mais atemporal dos dilemas, a dicotomia da sobrevivência, seja da natureza e do meio ambiente, seja de sociedades inteiras.
“A água resume muito isso.
Os fluxos e refluxos do oceano nos dão e nos tomam.
Pegam e devolvem num ciclo contínuo e secular.
A água que também é gestação, signo da vida, também destrói e mata.”
Reflete o artista.
Instigado por essa temática, Moreira embarcou para Portugal.
Carreira aprimorada na Europa
Na Costa da Caparica e na aldeia montanhosa de Piódão, ainda com a ideia dos fluxos e refluxos e da existência das ondas migratórias – não somente de aves e animais marinhos, mas de imigrantes e refugiados. “Algumas pessoas me perguntaram por que escolhi Portugal.
Na verdade, foi uma coincidência ou uma ironia.
Hoje já não sei.
Estava no país de férias e às margens do Atlântico e comecei a pensar nesse caminho real e imaginário entre as costas portuguesa e brasileira.
Olhava o aglomerado de aves e ao mesmo tempo pensava nas aglomerações dos navios negreiros e nos telhados e lajes que compõem o horizonte do Jardim Ângela.
Nessa divagação que me incomodava peguei minha câmera e comecei a registrar aqueles momentos”.
Foram dois anos de captação de imagens e tratamentos.
Impressionou o Galerista
O resultado dessa dedicação impressionou o curador da exposição, o fotógrafo e galerista Gabriel Wickbold.
“O projeto do Luiz me chamou a atenção pela textura e fotografia vibrantes, assim como a forma com que o olhar dele buscava captar texturas e formatos imagéticos.
Foi aí que ele me cativou.
Além disso, delimitar a temática a uma viagem, no caso Portugal, permitiu-me exercitar uma curadoria focada em um lugar só e na relação desse local com seus moradores e suas rotinas de vida e trabalho.”
Afirma Wickbold.
A mostra, conforme afirma AllexColontônio, jornalista e autor da resenha analítica sobre o conjunto de imagens selecionadas pelo curador;
“Mais do que uma expressão de sua sensibilidade, é um convite à reflexão em temas abertos que questionam valores e condutas sociais numa época em que as pessoas parecem quase lobotomizadas pela cultura do egocentrismo, da exploração da celebridade e da febre da selfie”.
De forma sintética, Collontônio define:
“A série é, também, uma janela para um mundo novo sob o olhar de um artista jovem que apresenta um recorte extremamente maduro das relações humanas”.
Sobre Luiz Moreira e sua trajetória profissional
Nascido em 1989, em São Paulo, Luiz Moreira iniciou sua relação com a fotografia ainda na adolescência, aos 16 anos, quando atuava como modelo.
Dono de uma pequena câmera digital, ele também fazia ensaios de sua irmã e as amigas modelos nas lajes do bairro em que nasceu e morava.
Em 2011, iniciou o curso de Comunicação Social em Araçatuba (SP).
Nessa mesma época, decidiu investir em uma câmera semiprofissional, a qual foi utilizada em sua primeira viagem internacional (Itália).
Graduação acadêmica
Depois desse contato com a cultura e a arte no país europeu, sua fotografia ganhou, nas palavras de Moreira, “um olhar completamente renovado, valorizando pessoas, arquiteturas e paisagens, apegando-se ao cotidiano e suas múltiplas raízes”.
Já graduado academicamente em 2015, restabeleceu um contato mais estreito com a fotografia de moda na capital paulista.
No ano seguinte, quando esteve pela primeira vez em Nova York, produziu uma série de registros pelas ruas de bairros emblemáticos, como Queens, Harley, China Town, Manhattan e Bronx, captando a cultura local e sua ampla diversidade.
Em outra viagem, desta vez ao Marrocos, o cenário antigo e milenar do país africano o induziu a uma imersão histórica durante 15 dias em diferentes localidades, como Fez e seus seculares curtumes de tingimento, o próprio Deserto do Saara e a imprescindível Marrakesh.
Foco no universo Fashion
Ainda em constante diálogo com o universo fashion, o fotógrafo realizou diversos ensaios fotográficos com modelos em Miami, ampliando seu olhar e, simultaneamente, imprimindo uma característica pessoal e marcante em seus trabalhos.
De retorno ao Brasil (em 2017), deu início à produção de sua primeira obra autoral, “Midas”, na qual o fotógrafo faz uma releitura fotográfica de um conto da mitologia grega sobre o rei que ao tocar objetos transformava tudo em ouro.
Para obter os efeitos que desejava, Moreira tingiu de dourado o corpo de dois modelos negros para, propositalmente, evidenciar a nobreza ancestral da raça.
Esse trabalho repercutiu em diversas plataformas digitais associadas a entidades de matriz africana em todo o mundo, conquistando maior destaque no Afropunk, que exerce papel fundamental nesse movimento (http://afropunk.com/search/Luiz+moreira/).
Produção de Editorial
Ainda no mesmo ano, produziu um editorial de moda na ilha portuguesa de Berlengas, compondo imagens e situações em harmonia com o ambiente e a modelo, que dançava com o vento durante todo o shooting (http://afropunk.com/2017/09/free-spirit-dances-wind-vibrant-photo-series/).
Ao final de 2017, Moreira conheceu Wickbold, que o convidou para integrar uma exposição coletiva chamada “Recortes da Natureza Humana”, que reuniu 12 renomados fotógrafos do Brasil e exterior (https://www.instagram.com/p/Bcs5QP6F_ym/?taken-by=gabrielwickbold).
Em suas andanças mundo afora, ele havia produzido imagens que remetiam à ligação do homem com a natureza, as quais adequavam-se à temática proposta da mostra.
Foi a primeira vez que Moreira teve um trabalho exposto em uma galeria de arte.
Para finalizar o ano com mais conquistas, o artista viajou para a África do Sul, precisamente para Johannesburg, para cobrir o Afropunk Festival (http://afropunk.com/2018/01/afropunk-joburg-2017-shot-luiz-moreira/).
No início de 2018, Wickbold demonstrou interesse no trabalho fotográfico de Moreira produzido em terras lusitanas com pescadores e o convidou para participar da SP Arte (https://www.instagram.com/p/BhcyOrlnQfI/?taken-by=lp.moreira).
Após o encerramento do evento, e diante da boa repercussão da obra “O Pescador” junto ao público, o galerista o convidou para expor individualmente a série ambientada em Portugal.
PORTA DO MAR
Onde: Gabriel Wickbold Studio &Gallery
Endereço: Rua Lourenço de Almeida, 167 – Vila Nova Conceição
Quando: 20/7 a 20/8
Horário: segunda a sexta, das 10h às 18h; aos sábados, das 11h às 17h
Indicação etária: livre
Ingresso: gratuito
Facilidades: acesso a portadores de mobilidade reduzida; não tem estacionamento
Atenção: 19 de julho ocorre vernissage somente para convidados
RESENHA ANALÍTICA – POR ALLEX COLONTÔNIO
Porta do Mar
Capturada nos rincões de uma Portugal menos óbvia do que a dos carnetsduvoyage, de enseadas pesqueiras acinzentadas como a Costa da Caparica às aldeias mais inóspitas, como Piódão, a série Porta do Mar é também uma janela para um mundo novo sob o olhar de um artista jovem que apresenta um recorte extremamente maduro das relações humanas.
Por trás dos 19 trabalhos apresentados na Gabriel Wickbold S &Gallery nesta primera individual de Luiz Moreira, garoto da periferia paulistana que muito cedo colocou os dois pés na estrada, em odisseias que serpentearam esses muitos Brasis antes de alcançar África, Estados Unidos e Europa, há muito mais do que plástica, composição, profundidade e poesia.
Sem discursos demagogos, o fotógrafo de 28 anos vem fazendo de seu trabalho mais do que uma expressão de sua sensibilidade, mas um convite à reflexão em temas abertos que questionam valores e condutas sociais numa época em que as pessoas parecem quase lobotomizadas pela cultura do egocentrismo, da exploração da celebridade e da febre da selfie.
Dramáticas em seu p&b de apelo histórico impresso em papel algodão superdimensionado, para operar quase que como um grande portal para o observador, que se projeta na imagem por conta de sua textura e hiperrealismo sem qualquer interferência póstuma, as fotografias transbordam do impacto estético de belos landscapes e outros recortes oníricos de um cotidiano aparentemente frugal.
Não se trata de fotojornalismo documental, já que Moreira não condiciona situações, não persegue o caos, as passeatas, os movimentos migratórios, as zonas de confito ou tampouco explora a miséria. Embora bastante crítica, sua arte, erigida da beleza da banalidade, procura sorver o extraordinário do ordinário.
Um dos exercícios mais complexos da fotografia contemporânea.
Para atingir esse nível de veracidade, o artista também precisou se desprender do universo fashion.
Sua primeira experiência foi como fotógrafo de moda e sua formação em Publicidade tendia a potencializar nuances mais cartesianas;
Para rechaçar ângulos posados e se limitar ao que a cena lhe impõe.
O feeling para flagrar um “instante instantâneo”, contando mais com a sutileza do que com a sorte, para escrever com o diafragma as metáforas que compõem a mensagem que quer calcar nas paredes do espectador. Ao refazer o caminho reverso da colonização portuguesa no Brasil.
Luiz aborda a imensidão e a fúria do oceano, desde as arrebentações bravas de Nazaré que evocam as naus lusitanas singrando o Atlântico, até a simplicidade do indivíduo penitente no fardo da pesca, abastecendo famílias inteiras com as sardinhas que saltam abundantes de suasredes;
Da velha senhora escalando a viela do longínquo casario de pedra cravado na montanha, a outras situações que denunciam o isolamento de uma pequena comunidade lutando pela sobrevivência, sob a envergadura das gaivotas marginais que disputam com eles o peixe de cada dia.
Fragmentos severos de um tempo que não para.
Nem ali, nem em qualquer megalópole de qualquer continente.
Luiz Moreira nos abre domus, portas e janelas que, invariavelmente, desembocam dentro de nós mesmos