Aumente seu parassol. Enlarge your lens hood. Até parece título de spam malicioso, não é? Não estou querendo lhe vender nada, apenas fazer um apelo à razão na hora de configurar seu equipamento. Você quase certamente está usando mal seu parassol. Como assim? Continue lendo, é rapidinho.
Para quem chegou agora ao mundo maravilhoso da fotografia, o parassol é aquela peça exótica que fica encaixada na frente de muitas objetivas e cujo propósito é proporcionar à sua câmera um aspecto “profissional” e imponente. OK, muita gente pensa exatamente nesses termos, mas o verdadeiro motivo de existir o parassol é como parachoque, evitando colisões que possam riscar o precioso vidro da lente. OK mais uma vez: ainda não é esse o verdadeiro motivo da existência da peça, se bem que existem modelos de borracha flexível que cumprem essa função com galhardia.
A função fundamental do parassol é evitar que qualquer raio de luz vindo de fora do ângulo de cobertura da lente possa entrar nela obliquamente e interferir na captação da imagem. Usualmente essa interferência é reconhecida na forma do flare (“flér”), aquela mancha de luz colorida que em alguns círculos é identificada como uma característica essencial da fotografia “vintage”.
Mas o “flare” pode ser totalmente insidioso e prejudicial, também, quando a luz se espalha de maneira uniforme dentro da lente e rouba contraste da imagem sem oferecer qualquer contrapartida estética. Fotógrafos menos atentos podem nem perceber que isso está acontecendo.
Lentes modernas são bastante resistentes ao flare, porque os elementos possuem revestimentos antirreflexo (multi-coating). São camadas extremamente finas de substâncias especiais que eliminam a perda de luz por reflexo, aumentando o poder total de transmissão da lente e reduzindo a participação na imagem da luz espúria. Ainda assim, usar uma lente moderna sem proteção nenhuma é garantia de obter uma imagem menos contrastada, com mais estouro nas altas-luzes, menos informação visual nas áreas de sombras e mais difícil de ajustar na edição tonal.
Com isso, chegamos ao tema central deste artigo. Qual é o problema dos parassóis “oficiais” das lentes? Quase sempre eles são muito modestos, deixando de cobrir uma área significativa ao redor do cone de luz que a lente efetivamente entrega ao sensor. Para lentes zoom, isso é um dado inevitável: o parassol cobre apenas o suficiente para não gerar vinheta na posição mais curta (wide) da objetiva. Com objetivas fixas (ou prime, como dizem os geeks para mostrar que acompanham sites gringos), o parassol pode ser feito na medida exata para proteger a lente ao máximo.
Reconsiderando o parassol
Posto isso, vou apostar três fatos acerca do seu equipamento fotográfico, em se tratando de uma DSLR:
1) O sensor da sua câmera é DX/APS-C e não FX/full-frame. Simples probabilidade.
2) A sua câmera está equipada com uma lente originalmente criada para câmeras full-frame, com um ângulo de cobertura mais amplo que o do sensor.
3) O parassol da lente naturalmente está dimensionado para o uso em uma câmera full-frame.
Sendo verdadeiras as três afirmações acima, posso afirmar que o seu parassol está protegendo pouco a sua lente, pois não foi levado em conta que o ângulo de cobertura com o sensor menor também é menor. Para ser efetivo, ele deveria ser mais longo.
No exemplo acima, temos uma Canon de sensor 1.6×, apelidada em mau português de “cropada”, palavra que vem de crop ou corte, por possuir um sensor menor que o full-frame. A máquina está equipada com uma clássica lente fixa de 50mm. É uma lente simples, luminosa, pequena e versátil, que funciona bem sem nenhum parassol, mas não está livre de flare e perda de contraste.
A cobertura da lente de 50mm em uma câmera full-frame é de aproximadamente 47 graus na diagonal, estando o foco no infinito (o valor encurta conforme o assunto fica mais próximo da lente, mas isso só é perceptível em macrofotografia). Numa câmera com sensor de 1.6× como as APS-C da Canon, o ângulo de cobertura da mesma lente passa a ser de 30 graus. Eis uma tabela rápida com os ângulos de cobertura diagonais correspondentes às distâncias focais de lentes mais comuns. Câmeras Nikon DX e Sony APS-C possuem sensores um pouco maiores que os da Canon; nelas o campo de visão é um pouco maior, mas como é possível deduzir da tabela, a diferença só é perceptível com lentes ultra-grande-angulares.
Full-frame (36×24mm) | Nikon/Sony 1.5× (24×16mm) | Canon 1.6× (22,5×15mm) | |
8mm | 140° | 122° | 119° |
12mm | 122° | 101° | 97° |
14mm | 114° | 92° | 88° |
18mm | 100° | 78° | 74° |
22mm | 89° | 67° | 63° |
24mm | 84° | 62° | 59° |
28mm | 75° | 55° | 53° |
35mm | 63° | 45° | 42° |
40mm | 57° | 40° | 38° |
50mm | 47° | 32° | 30° |
70mm | 34° | 23° | 22° |
85mm | 29° | 19° | 18° |
100mm | 24° | 16° | 15° |
135mm | 18° | 12° | 11° |
150mm | 16° | 11° | 10° |
200mm | 12° | 8° | 8° |
300mm | 8° | 5° | 5° |
Pela tabela, com a minha câmera dá para colocar na lente de 50mm um parassol para lente de 75mm e ainda não gerar vinheta. Generalizando o raciocínio, qualquer lente de full-frame em sensor menor pede um parassol mais comprido.
urpreendentemente, o parassol “roubado” de uma lente de 135mm ainda não gera vinheta na minha lente de 50mm, mesmo tendo o dobro do comprimento do parassol original para 50mm! (A transparência na foto permite ver isso melhor.) A explicação para isso é que o diâmetro da peça também influi no seu campo de cobertura. E se ela for no formato de “pétala de flor”, que faz um recorte aproximadamente retangular na área de visão, o resultado é ainda mais complicado de avaliar.
Assim sendo, o parassol ideal para cada lente e câmera precisa ser determinado empiricamente. Experimente colocar sua câmera em Live View e deslizar um cartão de crédito da periferia para o centro da lente. Veja na tela o quanto o cartão consegue entrar sem começar a aparecer na imagem. É bastante!
Conclusão: o parassol correto para sua combinação de câmera e lente deve cobrir muito mais a frente do conjunto do que está cobrindo neste momento. O que está instalado agora não passa de um parachoque bonito para proteger a lente de pancadas e impressionar leigos.
Mario Vázquez Amaya é profissional de comunicação calejado que tem um pé no jornalismo e outro no marketing,
Fundador da RAW & ROLL