*Frank Meylan
Imagine o seguinte cenário: você precisa de um empréstimo e, então, efetua o login em uma plataforma on-line, digitando informações pessoais e detalhes da solicitação. Em poucos segundos, algoritmos de diferentes intermediários financeiros fazem uma leitura completa dos dados e das transações financeiras mais recentes e, com base na análise de risco, você obtém cotações de diferentes concorrentes. A partir daí, basta escolher a melhor opção e dar o consentimento em relação aos termos e às condições para receber o dinheiro na conta em questão de minutos. Tudo automatizado, sem intervenção humana.
Diante da rápida evolução tecnológica e das inúmeras possibilidades que a análise de dados oferece, é quase certo que situações como a que acabou de ser apresentada tornem-se realidade. Em muitos setores, a habilidade de interpretar os padrões das informações será o diferencial. Uma pesquisa científica recente sobre dados bancários reforça essa percepção. Nela, cientistas constataram que poderiam alcançar uma pontuação de crédito quase 50% mais precisa do que a realizada pelos bancos já que eles conseguem analisar fontes de dados externas e, consequentemente, examinar o novo campo de atuação da física social — como, por exemplo, o comportamento do consumidor — em vez de apenas dados bancários tradicionais como idade, renda ou histórico de pagamentos. Isso implica grandes oportunidades de obter vantagens competitivas.
No caso do setor financeiro, isso não ocorre somente devido ao grande número de possibilidades de análise de dados (Data & Analytics), mas também em decorrência da legislação que está sendo aplicada aos países da Europa. Acredita-se que a Diretiva de Serviços de Pagamento (Payment Services Directive – PSD) da Comissão Europeia irá estremecer o cenário financeiro e indicar novos caminhos para inovações. Uma das provisões na PSD é que os bancos serão obrigados a conceder acesso a outras partes (que não sejam bancos) de dados de pagamento, o que permitirá novos produtos e serviços. Por meio do uso de Interfaces de Programação de Aplicativos (Application Programming Interfaces – APIs), terceiros podem abrir a caixa de Pandora dos bancos e oferecer aos consumidores um leque de opções para que eles interajam com bancos, desde que tais clientes concordem explicitamente com isso.
Mas não é apenas o setor financeiro que se beneficiará. Na Suíça, por exemplo, uma nova lei federal em relação a registros eletrônicos de pacientes será implementada no ano que vem. Os hospitais e os lares para idosos precisarão se adaptar a essa legislação, incentivando a digitalização do setor de serviços de saúde, o que vai permitir aos pacientes acessarem os próprios registros. Isso oferece oportunidades para novos produtos, serviços e modelos operacionais de serviços de saúde em setores relacionados, como o farmacêutico, além de influenciar o modo como as prestadoras de serviços de seguro interagem com os clientes e processam os casos de sinistro.
Há de se convir que um pouco de imaginação pode resultar em inúmeras novas possibilidades. Todos os setores que se baseiam em informações passarão por grandes transformações nos próximos anos. Temos observado que concorrentes em determinados setores da economia têm avançando fronteiras e introduzindo modelos de negócio disruptivos. Reflita sobre os setores de viagens, seguros e táxis, a indústria da música e até o setor automotivo, nos quais novas empresas oferecem propostas novas com base no uso inteligente de dados. Vinte anos atrás ninguém considerava esses setores como sendo ricos em dados. Atualmente, essas informações estão no cerne das estratégias de negócio.
O fato é que muitas áreas ainda não foram exploradas. Embora as empresas e as instituições estejam tomando as medidas iniciais rumo a uma sociedade orientada a dados, é difícil imaginar até onde esse desenvolvimento pode chegar. Tudo isso nos remete aos anos 90, época em que surgiu a internet, quando ficou evidente que o mundo estava diante de uma grande mudança, mesmo que ainda não tivesse ficado muito claro qual seria.
No mercado atual, as leis do Darwinismo digital implicam que não são as empresas mais fortes — as líderes no mercado — que serão as vencedoras de amanhã, e sim as que são capazes de adaptar-se às mudanças da melhor forma possível e com mais rapidez. Isso terá como consequência o fato de muitas delas, mesmo as já estabelecidas no país, ainda precisam mudar rapidamente para se tornarem bem-sucedidas e, dessa forma, salvaguardar um modelo de negócio viável para o futuro.
*Frank Meylan é sócio da KPMG no Brasil