À primeira vista o cenário pode parecer estranho. Quando se pensa em desenvolvimento tecnológico e inteligência artificial, nos vem à cabeça algum ambiente de arquitetura high tech do Vale do Silício, ou os bairros mais modernos do Rio de Janeiro e São Paulo. No entanto, foi para o esplendor renascentista do Vaticano, com suas obras de Rafael, Michelangelo, Bernini, que os olhos da comunidade científica e dos empreendedores em tecnologia se voltaram esta semana. As atenções estiveram focadas num acordo feito entre o Vaticano, Estado que sedia a Igreja Católica Romana, e as gigantes do setor informático IBM e Microsoft.
O objetivo do acordo é debater do ponto de vista ético os avanços na área de Inteligência Artificial. O Vaticano tem um departamento específico voltado para a questão da ética na ciência há quase vinte anos, desde o pontificado de João Paulo II. Naquela época o assunto mais relevante era a clonagem de seres vivos, cujo marco foi o anúncio do nascimento da ovelha Dolly, o primeiro mamífero a ser reproduzido a partir de uma célula adulta, no Instituto Roslin, na Escócia.
Agora, diante da revolução da Inteligência Artificial, altos executivos da Microsoft e da IBM firmaram um acordo com os líderes católicos para colaborar em soluções de desenvolvimento tecnológico computacional “centradas no ser humano”, como ficou definido por um documento comum. O manifesto, chamado Ética de Roma, foi coassinado pelo presidente da Microsoft, Brad Smith, pelo vice-presidente executivo da IBM, John Kelly III, e pelo presidente da Pontifícia Academia para a Vida, Arcebispo Vincenzo Paglia.
As questões que estarão em debate a partir de agora, quando a Inteligência Artificial parece estar ultrapassando um limiar, são complexas, e devem, como propõem os líderes religiosos e empresariais, passar por uma ampla apreciação. Cabe à sociedade responder a perguntas sobre o papel dos algoritmos no mercado de trabalho ou nas interações pessoais e afetivas, por exemplo. E, claro, há ainda a questão mais delicada de todas, que é pensar o seu status futuro, podendo ocorrer que, no limite, como já antecipam as obras de ficção científica, sejam criadas máquinas cujas consciências possam ser comparáveis com as de humanos.
Num momento de grandes transformações como o de agora, não é legítimo que a ciência e a técnica avancem sem uma reflexão ética, que ajude a estabelecer balizas e guiar os próximos passos rumo ao futuro. Nesse sentido, unir instâncias tão distintas com esse objetivo comum é um saudável exercício de democracia.
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